Debate sobre direitos autorais ganha força com criação de CPI do Ecad

Diário de Notícias

O debate sobre os direitos autorais no país pode ganhar novos contornos com a criação da Comissão Parlamentar de Inquérito do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad), órgão responsável por coletar e repartir entre os autores os recursos provenientes dos direitos relativos às suas obras. 

Os direitos autorais garantem ao autor a participação financeira e moral em vista da utilização da obra que criou. De acordo com o artigo 5º da Constituição federal, é de direito exclusivo do autor a utilização, a publicação e a reprodução das obras literárias, artísticas ou científicas por ele produzidas. Os direitos de autor surgem a partir do momento em que a obra é criada, quando a manifestação da ideia acontece por meio de um corpo físico, passando a receber proteção legal. É o que ocorre com textos, livros, softwares, pinturas etc. Para efeitos legais, os direitos autorais são divididos em direitos morais e patrimoniais. Os morais são “laços permanentes que unem o autor à sua criação intelectual, permitindo a defesa da sua própria personalidade”, como define o Ecad. Já os patrimoniais são os que dizem respeito à utilização econômica da obra intelectual, por qualquer processo. Com a Lei 10.695/03, os crimes de violação de direito de autor com intuito de lucro, ainda que indireto, deixou de ser considerado de menor potencial ofensivo e a pena estabelecida foi de reclusão de dois a quatro anos, multa e apreensão dos bens ilicitamente produzidos. 

Como o Ecad arrecada os valores a serem pagos 

O Ecad calcula os valores que devem ser pagos pelos usuários de música de acordo com os critérios do Regulamento de Arrecadação desenvolvido pelos próprios titulares, por meio de suas associações musicais. O regulamento classifica o nível de importância da música para a atividade ou estabelecimento, como indispensável, necessária ou secundária. Considera ainda a periodicidade da utilização (se permanente ou eventual) e se a apresentação é feita por música mecânica ou ao vivo, com ou sem dança. O valor a ser pago é calculado de acordo com o evento (realizado a partir das informações fornecidas pelo promotor) e a forma de cobrança é determinada em função do parâmetro físico ou de percentual incidente sobre a receita bruta.

Tipos de usuários 

Permanentes: São os usuários que, num mesmo local de que sejam proprietários, arrendatários ou empresários, tiverem efetuado no mínimo oito espetáculos ou audições musicais por mês durante dez meses em cada ano civil 

Eventuais: São aqueles usuários que não se enquadram no item anterior, ou seja, que utilizam a música eventualmente 

Usuários gerais: Academias de ginástica, cinemas, boates, lojas comerciais, bares, restaurantes, hotéis, supermercados, shopping centers, clínicas, etc. Shows e eventos: Promotores de eventos e audições públicas, casas de espetáculos com shows eventuais, eventos gerais como festas juninas, Carnaval, réveillon, etc. 

Rádio e TV: Emissoras de rádio e TV, incluindo as de sinal aberto, por assinatura, rádios web, rádios comunitárias, etc.

Como proceder 

O pagamento da retribuição autoral deve ser efetuado previamente. O usuário fica obrigado a fornecer os meios adequados para que se verifique a veracidade das informações que servirão de base para o cálculo do pagamento, bem como os dados para a distribuição dos direitos. Todos os pagamentos são realizados por rede bancária. Ao Ecad não é permitido, por lei, aceitar valores em espécie ou de qualquer outra forma, através de seus funcionários e/ou agências autônomas terceirizadas. 

Para desempenhar suas funções, os funcionários e as agências autônomas terceirizadas possuem credenciais de identificação que devem sempre ser apresentadas aos usuários de música, durante o exercício de suas atividades. Quando um evento contemplar obras em domínio público e obras protegidas, o cálculo dos direitos autorais será proporcional e considerará apenas as obras protegidas. Os ingressos cortesias ficam limitados a 10% do total de ingressos vendidos. 

Sobre o número de ingressos que exceder essa cota, os direitos autorais serão cobrados da seguinte forma: total da bilheteria dividido pela quantidade de ingressos vendidos; a partir daí resultará o valor médio, que deverá ser multiplicado pela quantidade de cortesias excedentes. No caso de shows e eventos realizados por entidades beneficentes, os preços do Regulamento de Arrecadação sofrerão uma redução de até 25%, desde que seja apresentada toda a documentação necessária. 

Quando a execução for exclusivamente ao vivo, os valores da tabela de preços sofrerão uma redução de um terço, seja pelo critério de cobrança por participação percentual, seja por parâmetro físico. Isto ocorre porque, se a execução é ao vivo, inexistem os direitos conexos a serem remunerados, já que não há execução de fonograma. 

Comissão define plano de trabalho Instalada no dia 28 de junho, a comissão parlamentar de inquérito (CPI) que vai investigar denúncias de irregularidades no Ecad deverá definir o seu plano de trabalho nesta semana. A CPI, que é a segunda a ser instalada no governo Dilma Rousseff, é presidida pelo autor do requerimento de sua criação, senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), e tem como relator Lindbergh Farias (PT-RJ). 

Além de supostas irregularidades no que diz respeito ao sistema de arrecadação e distribuição dos direitos autorais, serão investigados pelo colegiado possíveis abusos da ordem econômica, prática de cartel no arbitramento dos valores de direito autoral e supostas alterações na Lei do Direito Autoral. 

Na justificação do requerimento, Randolfe Rodrigues afirma que “cabe ao Senado contribuir para a apuração dos desvios denunciados e a aprovação de regras que assegurem a correta arrecadação e distribuição dos direitos autorais pelo Ecad”.Conforme a proposta de plano de trabalho da CPI, composta por 11 titulares e seis suplentes, a investigação vai abranger o período de janeiro de 2001 até a data do requerimento de criação do colegiado. O relatório final da CPI será apresentado na última semana de outubro, depois da realização de oito audiências públicas e diligências em São Paulo, Macapá, Rio de Janeiro e Salvador. 

Assunto é tratado legalmente desde a Constituição de 1891 

O direito autoral no Brasil foi reconhecido a partir da Constituição de 1891. As cartas magnas de 1934, 1946 e 1967 também trataram do assunto, mas a necessidade de regulamentação só ficou explícita na Emenda Constitucional 1/69, que determinou: “aos autores de obras literárias, artísticas e científicas pertence o direito exclusivo de utilizá-los. Esse direito é transmissível por herança, pelo tempo que a lei fixar”. 

As sociedades de defesa dos direitos autorais surgiram no início do século 20, com o objetivo de defender os direitos de execução pública de obras de seus associados. A primeira foi a Sociedade Brasileira de Autores Teatrais, fundada em 1917, e que, pouco depois, permitiu também a filiação de compositores musicais. Logo surgiram outras entidades com o mesmo fim, gerando um problema: o pagamento a uma associação pela utilização de uma obra não impedia outra entidade de executar nova cobrança, já que, muitas vezes uma música era composta por dois autores filiados a associações diferentes. 

Com a promulgação da primeira Lei de Direitos Autorais (Lei 5.988/73), surgiu o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad), administrado pelas associações de titulares, que passou a arrecadar e distribuir os direitos autorais, e a se responsabilizar pela documentação necessária. Lei prevê figuras como autor versionista ou adaptador. 

Para entender melhor a complexa questão do direito autoral, é importante destacar também o funcionamento desse mecanismo no mercado musical. Pela lei, o autor é considerado “pessoa física criadora”, que, no caso específico da música, pode ser o autor ou o compositor. Eles podem autorizar que seja feita uma versão da sua obra, nascendo aí a figura do autor-versionista. A versão caracteriza-se por ser uma nova obra, derivada da original já existente. No entanto, o autor original, no momento da distribuição de valores, também recebe um percentual. Existe também a figura do autor-adaptador que é quem faz adaptação sobre obra em domínio público e recebe os valores distribuídos e relativos à adaptação que criou. Dentro do ramo dos direitos autorais, há ainda as editoras musicais, que não são caracterizadas como autoras, mas exercem a titularidade dos direitos dos autores que representam em razão de contratos de edição ou cessão de direitos. Os direitos conexos são os direitos reconhecidos a algumas categorias que auxiliam na criação, produção ou difusão da obra intelectual. Entre os titulares conexos estão os intérpretes, músicos acompanhantes, produtores fonográficos e as empresas de radiodifusão. 

Saiba mais

Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) www.ecad.org.br
Associação Brasileira de Direitos Reprográficos www.abdr.org.br
Página dos direitos autorais do Ministério da Cultura http://migre.me/5aQZf

 

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